
Olhares atônitos penetravam as janelas de vidro dos carros em direção ao homem, que parecia se preocupar mais com todo o espaço a sua volta do que com aquelas cores oscilantes que determinavam o momento em que ele deveria seguir, e também parar. Sentia-se limitado para entrar no lugar onde ele passara a maioria de suas tardes naquela época em que sua mãe lançava-lhe olhares atentos ao mesmo tempo que um sorriso reluzente delineava os seus lábios, enquanto ele brincava com a neve que recobria todo o lugar nas poucas manhãs invernosas de Reiquiavique.
Sua mão direita soergueu-se de um dos bolsos do sobretudo, e passou certo tempo ali frente a sua cintura, pensante, mas então seguiu ao seu peito, tão vazio como a velha estátua e como aquele cenário antigo, que já não possuía mais os seus principais elementos, e que nunca voltaria a ser o mesmo, assim como aquela ranhura em seu peito nunca cicatrizaria.
O tom esverdeado da sinaleira indicou que todos poderiam seguir. O homem fitou a maquinaria ligeiramente, e em seguida direcionou os seus olhos ao relógio de pulso. Estava na hora. Uma dor incessante penetrou em seu coração velho, alguns gemidos incontidos de dor deixaram a sua boca. Ele já estava jogado ao chão, soltando os seus últimos suspiros quando uma rosa veio a pousar em sua mão, uma criança a jogara de um dos carros em movimento. O homem esforçou-se até conseguir libertar um sorriso, já não fazia aquilo havia tanto tempo, e por fim deixou-se adormecer naquele sono profundo. Ele esperara tanto por aquele dia, era a única forma de tentar voltar à Tudo.
Deângela