sexta-feira, 21 de maio de 2010

Para onde levaram minhas galochas?


Meus pés enrugados agitavam a água ao mesmo tempo em que toda aquela corrente de frio percorria o meu corpo. A brisa gélida desgrenhava os meus cabelos enquanto os meus olhos se direcionavam ao marujo perdido que voltava para casa, finalmente ele conseguira encontrar o caminho da estabilidade, bem mais acima do topo dos degraus da escada e bem mais fundo que o chão da queda brusca, um lugar que ninguém conhecia, que nenhuma locomotiva chegara a alcançar.

Os seus traços se desvaneavam em meio a névoa cinzenta e quando, através de um esforço, consegui enxergar o movimento de um de seus braços indicando a última despedida. Ergui o meu braço esquerdo, abrindo ainda mais caminhos para o escarlate que surgia em meus pulsos e ensopava as longas mangas de meu pijama, e acenei de volta. Uma lágrima deslizou por sobre a minha face e um sorriso melancólico delineou os meus lábios, ele havia desaparecido. Fitei as penugens que recobriam o gramado e logo o relógio celeste me indicou que já estava na hora de retornar, retornar como o marujo havia feito, mesmo que o meu destino não fosse tão prazeroso quanto o seu.

As poças d'água que destacavam o asfalto eram o meu caminho guia para casa. Pulava em cada uma delas sem a preocupação de ensopar qualquer um daqueles sonâmbulos que vagavam por ali, dava importância apenas aos respingos de água gelada que encharcavam as minhas vestes e lavava a minha face. Acostumei-me tanto com esta loucura, que agora já era algo compulsório. Perdi o balanço de uma circunferência quase perfeita e caí para trás, contribuindo ainda mais para aquele banho desconexo. Mas com a força da mente deslizei novamente para frente. Tudo agora estava diferente, tudo parecia ter mudado de uma forma inimaginável. Ou talvez não, talvez aquele impacto apenas servira de ajuda para eu enxergar que eu apenas estava girando dentro daquele guarda-chuva durante tantas vezes, durante tanto tempo. Que eu havia explodido. Que a paz se fora. Que tudo se movimentava rápido demais para que eu pudesse acompanhar tal ritmo. Que eu estava dominada pelo cansaço. Que eu tinha um cérebro aos prantos. Que eu era apenas mais um sonâmbulo ali.



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